sexta-feira, fevereiro 17, 2006

O meu amigo Pedro


Podem passar quinze anos que as pessoas não mudam. E até setenta. Nós hoje ficámos mais tempo juntos, os três, sem fazer nada, simplesmente a empatar a nossa despedida. E depois fiquei mais duas horas a falar com o Pedro, atrasado, com imenso que fazer, especialmente hesitante se deveria comprar haveres no supermercado para mais um conviva...

Eu sempre pensei que quando nos voltássemos a encontrar teríamos a mesma intensidade, o mesmo afecto, a mesma honestidade. É aquela coisa que só se faz com um grande amigo. Começa-se a falar logo directo à conclusão das matérias, é esse o ponto de partida das nossas conversas. Porque para além de meu amigo, o Pedro é muito inteligente e isso faz com que se perca menos tempo com o percurso.

Sendo de uma profundidade entusiasmante e inspiradora, o Pedro falou-me até da superficialidade. O meu ego sai muito favorecido das nossas conversas e fico cheio de vontade de voltar a acreditar. Gostava de lhe retribuir, não é isso gostar de alguém?, e se calhar, em menor, escala também acontece.

A minha vida mudou radicalmente quando conheci o Pedro (e o Paulo, claro). E como dois anjos, regressaram no preciso momento em que estou de novo à beira de mudar.
E apesar de termos falado de quase tudo o que é possível falar, acho que só falámos mesmo de amor. Não chegámos a nenhuma conclusão porque, claro está, isso estragava a conversa que vamos ter daqui a quinze anos.

Ainda estávamos os três quando passámos cinco minutos à procura de um número de telemóvel escondido nas costas de uma pauta. É com estas pequenas partidas que o nosso subconsciente nos recorda a alegria de viver. E até porque pedimos ao Paulo que nos deixasse abrir a pasta mágica dos sonhos em cima de uma mota, para provocar um incidente. O Paulo, não se desmanchando, vestiu imediatamente o hábito e qual professor e mestre indicou o espaço propriamente colocado pela civilização para abrir as malas dos sonhos, das fantasias e das máscaras.
Por seu lado o Pedro, acho eu, levou demasiado a sério a parte das máscaras e repreendeu-se a si próprio sem razão nenhuma.
O que eu acho que o Paulo percebeu e bem é que nós só quisemos provocar o tal incidente porque sabemos que ele não nos deixaria. Se alguma pequena coisa mudou é que nós agora também podemos ser recíprocos e às vezes também não o deixar fazer qualquer coisinha que ele não queira realmente fazer.

Eu, por andar metido com os imortais, ganho uma áurea especial que faz de mim um semideus. E isso já me chega.

3 Comments:

At 1:15 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Amigo querido,


Sobre a imortalidade e a meia divindade do semideus, ser-me-ia mais fácil a mim falar a teu propósito... ? ou não tivesse eu tanto de construção, como tu de autenticidade.

De resto, essa tua forma mágica de ternura sem melancolia é muito mais do que um simples atributo celeste. ("Os deuses são deuses / Porque não se pensam", dizia Reis o epicurista, dos heterónimos o mais lúcido...) Pensar-se despindo-se de orgulho vai para lá do humano e do divino.

Não será essa uma forma particularmente completa de realização íntima e arte de viver?...

PA

 
At 11:16 da manhã, Anonymous Anónimo said...

Fiquei sem palavras ao ler o comentário e à respectiva resposta.
Humberto Bernardo e Pedro Amaral eu amo-vos apaixonadamente

 
At 12:09 da tarde, Blogger Clara Cymbron said...

Um grande post, muito sincero... nem todos têm essa capacidade de se expor... parabéns. bjo

 

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