terça-feira, junho 19, 2007

Portugal no fundo, ou o país onde o ridículo não tem limites

Desde 1999 que o Estado português tomou a decisão, estudada então há 30 anos, de localizar o novo aeroporto na OTA.
Essa decisão ficou a dever-se a factores ambientais que reprovavam o Rio Frio (a outra hipótese em cima da mesa), por causa dos impactes fortíssimos que causaria na região e consequentemente na Grande Lisboa.

Desde então, nenhum governo, nenhum técnico e nenhum grupo de empresários, subterrâneos ou superficiais, contestaram o assunto. Corrigindo: um só técnico escreveu e batalhou o assunto. O militante socialista, António Brotas, foi o único português que nunca se conformou com a escolha da OTA em detrimento do Rio Frio, solução que provavelmente ainda defende. Desligado de interesses em vender ou comprar estudos, Brotas confundiu duas coisas: a sua capacidade técnica, com a sua capacidade de decisão política. Foi, embora legitimamente, porque movido por verdadeira vocação de fé, um percursor da confusão que se viria a instalar.

O único motivo pelo qual todos os outros técnicos, empresários subterrâneos ou superficiais e partidos na oposição se borrifaram para quase dez anos de imobilismo foi um e só um: o Estado não conseguiria executar a maior obra pública de sempre. O decrescendo da economia, a recessão e finalmente a crise financeira e política de Durão/Santana/Portas levavam a que o Novo Aeroporto de Lisboa fosse uma miragem. Algo assumido, mas com nunca se concretizaria os deixava, a todos, descansados.

Este governo pegou na única questão que lhe assistia: retomar o projecto na fase em que estava. Financiar era o problema. Arranjar a solução para financiar era o caminho. Construir, o objectivo. Pronto. Tudo estragado. O país não aguenta uma decisão. Mesmo que a questão verdadeiramente secundária, embora muito importante, fosse a localização. Essa decisão estava tomada. Agora, havia que tomar as outras decisões que levassem à concretização da obra.

O Governo decidiu privatizar a ANA e com essa operação encomendar ao consórcio que a venha a adquirir, a construção e respectiva exploração, tanto do Novo Aeroporto de Lisboa, como dos outros aeroportos nacionais. Diz agora a esquerda que essa decisão prejudica os cofres do Estado. Estranha visão, a da esquerda e, ao mesmo tempo, perceptível. Estranha, porque essa posição revela algum desconhecimento do passado empresarial da ANA. Não que os resultados recentes não sejam animadores, mas estes não escondem anos e anos de dificuldades, longe de atingir os investimentos do Estado ao longo de décadas, longe de satisfazer os desígnios competitivos das economias globais. Perceptível, porque a esquerda conservadora suspeita sempre das privatizações, mesmo de sectores que não são estratégicos para o Estado, logo que não tenha qualquer vocação para os gerir.

A partir daí a preocupação generalizada, assuma-se, foi a de “demonstrar o erro do Governo”. E o “erro” consistia na opção que o Governo não tomou, a localização. Daí que desde a primeira hora, o próprio Primeiro-ministro, tenha dito na apresentação do Novo Aeroporto, a 26 de Novembro de 2006: “O Estado fez o seu papel, agora compete aos privados fazerem o seu”, abrindo claramente espaço para que se alguém tivesse algo a obstar, falasse ou se calasse para sempre. E alguém falou.


Um grupo de “técnicos” comandados pelo (estimável e competente) Professor José Manuel Viegas falou. Falaram, apresentando 8 páginas (através de um empresário subterrâneo ou superficial) que colocavam o Poceirão na comunicação social como “um estudo alternativo à OTA”. Era uma intenção de vender um estudo para a margem sul, mas já estava aí um estudo.

A seguir veio a defesa da necessidade incontornável de fazer o tal estudo. Prós e Contras debatiam diariamente. Um outro técnico fazia uma apresentação PowerPoint, espalhada em spam pela net, que demonstrava que a quantidade de terras a movimentar equivalia a não-sei-quantos campos de futebol. Demonstrava um grande lago e até uma montanha. Avisava para os terramotos e os ventos. Quarenta anos de estudos estavam assim qualificados: um PowerPoint com fundo negro demonstrava a impossibilidade de construir um aeroporto na OTA. E muitas pessoas acreditaram naquele homem. Provavelmente na sua classe é que já ninguém lhe dá crédito, depois de tamanha mentira.

O SOL, começava a sua longa missão: ajudar à destruição da localização OTA. Depois da parangona que intitulava estudo ao relatório do empresário subterrâneo e superficial, vinha agora com uma nova descoberta: a NAV, empresa que gere o espaço aéreo nacional, também “chumbava” a OTA. Assim sem mais nem menos. Claro sustentado num “novo estudo”. Tratava-se de uma “Simulação em tempo real”. Exactamente assim era enunciado o documento. Tratava-se de um relatório que simulava a capacidade de aterragens e descolagens com base nas actuais rotas aéreas, sem ter em conta que um novo aeroporto, em qualquer outra localização, vai obrigar à alteração total das auto-estradas actualmente definidas em consideração às necessidades da localização existente.

Ferreira do Amaral desdobra-se em entrevistas públicas a contestar a OTA e a sustentar a margem sul, independente do sítio exacto. O fantasma dá a cara. Mas os mesmos jornalistas que o aceitam “entrevistar” nunca relacionam a sua posição com os interesses naturais da Lusoponte de quem é presidente, nem o questionam sobre o seu envolvimento ou não na, viríamos a saber mais tarde, task force de empresários que sustentaram o tal prometido novo estudo.

Confusos? Calma, já chegaremos ao fundo. Às situações onde o país bateu no fundo, porque até aqui parecia tudo um jogo de interesses múltiplos que estranhamente confluíam no mesmo objectivo. Fazer parar o Novo Aeroporto de Lisboa.

Marques Mendes faz as figuras do costume e estranhamente retomar os últimos três anos de desgovernação, na qual simplesmente adiaram o país, é um balão de oxigénio para a sua liderança interna.

O governo, tal como afirmado a 26 de Novembro de 2006, aceita avaliar o estudo e aí dão-se as três situações que seguramente vão ser alvo de grande análise histórico/política.


O tal estudo afinal não era da CIP. Os vice-presidentes negam tal possibilidade e os directores também. Van Zeller, o empresário especialista certamente em jogos subterrâneos e superficiais, esclarece rápido. Um grupo de cerca de 20 empresários é afinal o patrocinador da iniciativa. Cada um não terá gasto mais de 25 mil Euros. O estudo de Alcochete custou MEIO MILHÃO DE EUROS.
E todos acreditamos: estes empresários não vão querer cobrar este dinheiro. Não! Fizeram-no a bem da nação. E mais. Quatro, cinco deram a cara. Os outros quinze… São bonzinhos, mas não têm cara. Levam a caridade para com o Estado tão a sério que não se revelam.


Todos os partidos políticos trazem a questão do aeroporto para a campanha de Lisboa. Mais: é o tema forte de todos os adversários de António Costa, o mais que provável vencedor da contenda.
Defendem o impensável, outra vez, todos! Todos os candidatos, menos António Costa, defendem a manutenção do Aeroporto de Lisboa. Isto quando toca à hipocrisia política não deixa ninguém de fora. O Zé faz tanta falta como o Telmo e a sua equipa é tão útil como a de Roseta: todos querem manter a Portela. É que justamente eu acho que há algo incontornável para um lisboeta. Tirar dali aquela porcaria e quanto mais cedo melhor, é fulcral. Nem que a localização seja na cochinchina. A poluição e o perigo eminente fazem parte da nossa vida diária. Era um grande favor que se fazia à cidade tirar o aeroporto daquela zona.
Afinal. Para todos os partidos, não obstante terem colocado o enfoque da campanha nesta temática, é afinal o PS que está a usar o seu aparente recuo como arma eleitoral. É o PS que se está a aproveitar do assunto do aeroporto e não os challengers do provável vencedor que colocaram o assunto na agenda das eleições.


E finalmente o comentador de futebol. E não, não me refiro a Sérgio Godinho. O outro… Um senhor chamado Rui Moreira.
Ele é simplesmente o presidente da Associação Comercial do Porto. Malta! Hello! Alguém está a ver o ridículo? O SENHOR RUI MOREIRA É PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO COMERCIAL DO PORTO e defende um novo estudo para a realização do aeroporto, Portela+1.
Não, não aparece como um cidadão português, que como todos os outros, pode opinar e realizar os estudos que quiser. Não, não é um especialista aeronáutico, em construção civil, ou Obras Públicas. Não, não representa um qualquer grupo fingido de empresários nacionais. Não, não e não.
Eu imagino se a Associação Comercial de Lisboa tivesse emitido uma opiniãosita sobre o descalabro da Casa da Música, sobre as contas do Metro do Porto, sobre a localização do Estádio do Dragão.
Os Cadilhes, Sousa Tavares, Bessas e toda essa boa gente do Porto declaravam imediatamente a independência do Porto, acusando Lisboa de colonialismo. Falta Alberto João Jardim falar sobre o aeroporto de Lisboa…
RUI MOREIRA, na qualidade de Presidente da Associação Comercial do Porto defende e quer fazer um estudo sobre… a localização do Aeroporto de Lisboa. Ninguém se ri. Os jornalistas, por exemplo ontem no “Diga lá excelência”, mantêm a face e toma lá pinhões. Fale, excelência, fale. Goze aí o prato, os seus cinco minutos de fama, que o povo não nota.