domingo, julho 09, 2006

Moral da história

O campeonato do mundo terminou. A Itália venceu e portanto parabéns.
Para alguma opinião saudosista venceu o mau futebol. Eu não concordo. A corrente que acha que antigamente é que futebol era futebol está, em meu entender, errada. Antes havia anti-jogo, atrasos permanentes para o guarda-redes, faltas muito maldosas, pernas frequentemente partidas, fraco despiste de infiltrações e doping, problemas sérios com as organizações dos torneios e a arbitragem na corda bamba. Hoje, o futebol é um jogo muito mais táctico, mais atlético, com maior rigor em matérias de arbitragem e de controlo de substâncias. Independentemente de quem organiza os campeonatos têm sempre profissionalismo e isenção. Esta é a visão de adepto, de quem gosta do jogo. E quem gosta de seguir o futebol aceita a teoria do meu amigo LP: não há vitórias imerecidas, resultados injustos. O futebol é objectivo e daí não se sai, ganha quem faz mais um golo que o adversário, jogue como jogue.
Uma coisa é comum ao futebol do antigamente e ao de hoje: os grandes jogadores, os que melhor jogam, os que mais cabeça têm, sobressaem. São os melhores. Ou como diria Millôr Fernandes: "Futebol é a única actividade que transfere a inteligência da cabeça para os pés."

Mas numa perspectiva mais racional é certo que a globalização do futebol trouxe consigo interesses diferentes. Marcas, vendedores de jogadores e dirigentes sem escrúpulos ensombram o futebol, não dentro do campo, mas fora. Daí a inexplicável opção por Postiga... Daí a quasi premonição da Galp no anúncio que fez... Meia dúzia de gatos pingados aguardavam, no spot publicitário, os "heróis de Berlim". Hoje essa imagem concretizou-se. Quem regressou foram os quase "heróis de Estugarda". Aí o povo português não se deixou enganar. Uma coisa é vencer, outra coisa é estar na final e outra coisa é ficar em quarto e ir para o estádio nacional ouvir o Roberto Leal. Não me interpretem mal: o quarto lugar é digno para os nossos jogadores e assenta bem nas capacidades da selecção. Mais não poderíamos aspirar, menos seria fraco. Assim está certo.

Ao ser campeã do mundo no momento em que o futebol italiano vive a maior crise de corrupção de sempre, a minha teoria ganha consistência. Ao contrário do que se diz, o chamado Calcicaos não implica só árbitros. Dirigentes dos clubes e responsáveis da federação estão implicados numa alegada manipulação de resultados desportivos. Numa atitude siciliana o ministro da Justiça italiana pediu contenção às autoridades judiciais...
Acresce que não esqueço as primeiras reportagens das conferências de imprensa do seleccionador Marcello Lippi. Chegados à Alemanha, para uma jornada que viria a ser vitoriosa, os jornalistas italianos só queriam saber se a estranha convocatória de Lippi reflectia o facto do seu filho ser representante de muitos jogadores. Ganhou, esquece-se essa dúvida e adiante.

Daí que o Apito Dourado, o Calciocaos e outros escândalos me dão confiança. Porque acredito que quem prevarica acaba por ser apanhado. E isso ao contrário de meter toda a gente no mesmo saco, "são todos uma cambada de corruptos", fortalece a confiança nos diferentes agentes, especialmente jogadores e árbitros.

Hoje houve um factor importante no Estádio Olímpico de Berlim. Joseph Blatter esteve ausente da entrega da Taça do Mundo, cabendo esse papel ao Presidente da Federação Alemã. Eles que em Fevereiro do ano passado tiveram um caso de corrupção, envolvendo um árbitro, Robert Hoyzer, que foi imediatamente suspenso de toda a actividade.
Não ponho as mãos no fogo por ninguém, mas "à mulher de César não basta ser séria" e os alemães parecem bastante profissionais e sérios na forma como encaram o jogo, visível aliás na maneira como decorreu a organização.
Não ter sido Blatter a entregar a Taça até pode ter sido uma birra de protagonismo, até pode ser um protesto do todo-poderoso presidente da FIFA pela expulsão de Zidane, mas a verdade é que para mim foi uma espécie de sinal de esperança.

Às vezes imagino que depois da evolução táctica, depois do desenvolvimento atlético a próxima revolução no futebol consistirá no afastamento da corrupção e da má moeda do fenómeno desportivo. Regulamentação legislativa, exigência da opinião pública e responsabilidade dos agentes, trarão uma nova ordem desportiva.

2 Comments:

At 9:39 da manhã, Anonymous Anónimo said...

Que foto bem escolhida!! :-)
Gosto da crítica. Parece-me muito lúcida. E eu sabia que ias apreciar particularmente a presença do Roberto Leal. Alguém me dá um help?
Olga

 
At 11:36 da manhã, Blogger HB said...

A lucidez é o meu forte...

 

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