quinta-feira, janeiro 20, 2005

RTP Cultura

Sugestão apresentada no Fórum Novas Fronteiras, 19/01/2005, Hotel Altis
Autor: Humberto Bernardo


Boa Noite. Saúdo o Secretário Geral, o ilustre painel e todos os presentes. Chamo-me Humberto, sou actor, de Lisboa e sou independente.

Enquanto aqui dentro ouvimos e reflectimos sobre Cultura, lá fora esgrime-se uma campanha eleitoral que se adivinha (por parte dos nossos adversários da direita) iletrada e intelectualmente pobre. Vão-nos acusar de tudo e de todas as formas, mas há algo que não ousarão tocar: é que o PS foi, é e será o único partido, com aspirações de governo, sensível às grandes causas da cultura, da arte e do seu desenvolvimento em Portugal.

Podemos olhar para o passado e verificar a acção do Manuel Maria Carrilho, do José Sasportes e do Augusto Santos Silva, em comparação com a total inexistência de política global, de medidas específicas e mesmo de intervenção de Pedro Roseta e Maria João Bustorff. Seria útil perguntar ao PSD: os senhores têm vergonha da cultura portuguesa? Parece sinceramente que sim!

E devemos também olhar para o presente: nesta sala estão valorosos pensadores e quadros de indiscutível qualidade dispostos a recuperar o tempo perdido pela direita. Alguém imagina o PSD, ou o CDS, a reunirem para abordar os problemas e as soluções que visem uma cultura afirmativa e espalhada democraticamente pelo território nacional?
Isto leva-nos a ter esperança no futuro: com o PS, Portugal vai seguramente voltar a olhar para a cultura não como o parente gastador dos dinheiros públicos, mas como a única sustentação possível para que cada português possa melhor entender outros grandes desafios da intelectualidade como são a educação, a tecnologia, o ambiente. É a cultura genericamente e nomeadamente uma democratização efectiva das artes eruditas que podem abrir a perspectiva do indivíduo e proporcionar-lhe novos horizontes de pensamento.
Imagino que um, cada vez mais impossível, futuro governo do PPD, apresentaria não políticas, não causas, nenhum espírito de missão, tão somente um nome para Ministro da Cultura: Nuno da Câmara Pereira. E isso, meus amigos, ninguém de bom senso pode aceitar.

Em toda a Europa governada por socialistas a cultura é uma marca de referência e o aumento de peso dos respectivos Ministérios uma constatação (que se verifica no aumento de percentagem financeira para a cultura no Orçamento dos Estados) e basta conhecer os exemplos de Zapatero e Blair (apesar de todas as justas críticas que se lhe podem apontar noutras matérias).
Portanto nenhuma política consistente para a cultura, pode ser desenvolvida sem o aumento efectivo de meios financeiros do respectivo Ministério. Dito isto resta a pergunta: de onde pode vir esse dinheiro? Cortando, por exemplo, no escandaloso despesismo gasto em pareceres de consultoria encomendados pelo estado nos últimos três anos (segundo os dados divulgados por Freitas do Amaral).

E esta constatação serve-nos para sossegar algumas reacções ao nosso humilde contributo para este debate: deixemos, pois, a "política" e passemos às "políticas".
Governar, é evidente, significa dar passos, por vezes pequenos e a nossa questão é não mais que uma simples ideia, que entendemos muito beneficiaria a cultura portuguesa.

Para contextualizar a nossa proposta, que tem a ver com a cultura e o Serviço Público de televisão: nos últimos três anos o Serviço Público de televisão teve, há que reconhecer, uma evolução positiva do ponto de vista empresarial, o que não significa que esteja tudo feito. Pelo contrário, mesmo nesta perspectiva é necessário e possível fazer melhor.
A verdade é que nos conteúdos houve um assustador retrocesso, dissimulado pela intervenção economicista pura e dura. Exceptuando a RTP1, que se manteve estagnada, em todos os outros canais, RTP2, RTPN e RTP Memória verificou-se uma triste farsa, onde se perdeu a oportunidade histórica de, repito em matéria de conteúdos, fazer evoluir o Serviço público de televisão.

Neste contexto, a minha questão é simples: Existirá espaço para a criação de um Canal televisivo dedicado integralmente à Cultura? Que seja criado, sob iniciativa e orientação do próximo ministério da Cultura o canal, no cabo, RTP Cultura.
Verificamos que a ideia pode não ser inovadora e das três, uma:
1º- nunca ouvimos discutida (nunca a ouvimos sequer, admitindo que pode ser por desconhecimento). Mas esta omissão dos círculos de poder, ou se quiserem das ante câmaras do poder e da opinião pública, representa que não é uma ideia ainda considerada útil. E isso é um erro.
2º- Talvez as cadeiras que se agitam perante esta sugestão, receiem os custos que essa operação traria, para o Ministério da Cultura. Pois bem, penso que esta proposta pode não trazer custos, uma vez que o referido ministério apoia os agentes culturais diversos, que beneficiarão com a RTP Cultura e essa não pode deixar de ser a missão principal do governo.
3º- O ponto de vista da RTP. Trata-se de reordenar toda a estratégia de canais temáticos da estação pública (assunto muito interessante, mas que não é para aqui chamado, talvez para um encontro específico sobre serviço público) e utilizar os meios humanos e técnicos já existentes. Em termos dos benefícios para a empresa, ninguém nunca mais poderá afirmar que a RTP não está a cumprir a sua missão.

Mas os grandes benefícios desta estratégia são para os agentes culturais e para os portugueses: no fundo, para Portugal.
Trata-se de um canal de Cultura erudita, que refuta as manifestações de populismo fácil (essas têm outros veículos), inspirado no Mezzo e no Arte, que terá o seu enfoque nos artistas portugueses, nas suas obras, clássicas e contemporâneas. Servirá para difundir (a tal democratização da arte que vos falei), sem pretender substituir o contacto directo com as diferentes formas de expressão artística, visará dar a conhecer, através do documentário, da entrevista e do debate, os criadores, as correntes, as novas tendências. Será veículo de informação e divulgação dos diversos espectáculos, exposições e conferências sobre a nossa cultura e será fornecedor de alguns conteúdos que podem e devem ser utilizados noutros canais do Universo RTP, como a Internacional e África.
A RTP Cultura poderá ser dirigida ao público específico dos eventos culturais e artísticos deste país, simultaneamente o mais mal tratado pela televisão de uma maneira geral e procurará despertar a sensibilidade dos públicos jovens, para um canal de referência e de qualidade.
Muitos outros aspectos deveriam sustentar este projecto (audiência, programação e até mercado) mas o tempo urge e não quero tomar mais da vossa valiosa disponibilidade.

E assim termino, deixando uma palavra de esperança, mas também de confiança para os que, em nome do PS e em nome de Portugal, venham a desenvolver um projecto de governo que faça da cultura e da nossa língua, a riqueza maior da pátria.

2 Comments:

At 3:45 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Lindo! Só que a seguir deves ter sido expulso. Tanto quanto sei, não foste convidado para orador principal, correcto? :-)
Parabéns. Tu tens um ponto.
OB

 
At 4:42 da tarde, Blogger HB said...

Não me mandaram calar, não chegámos à Madeira... Mas confesso que, fruto do meu nervosismo, custou a conquistar a plateia. No entanto, à medida que fui lendo, fui-me acalmando e acho que cosegui transmitir a ideia. O balanço foi positivo e da próxima, com mais prática, corre melhor.
No final recebi rasgados elogios, especialmente do Rui Vieira Nery (orador) que felicitou a minha intervenção. E já agora fui convidado para a Comissão de Honra do PS. Nada mau, para um modesto independente, afastado dos círculos do partido. ):

 

Enviar um comentário

<< Home